Suicídio: a primeira tentativa

Em setembro de 2009, fiz minha primeira tentativa de suicídio "estudada". Digo isso porque, antes de receber meu diagnóstico, no início do mesmo ano, desesperada, procurei nas bulas de todos os medicamentos que tinha em casa,  algum cuja overdose pudesse levar à morte. Pedi, então, que me entregassem algumas cartelas de Dramin. Tomei. Mas o telefone tocou e eu contei ao meu ex (vou chamá-lo de Eduardo) o que havia feito. Eduardo ficou meio assustado e eu me arrependi. Comecei a beber água e a vomitar. O organismo deve tar absorvido alguma coisa daquilo tudo, porque eu dormi muito. E só. 

Voltando a setembro de 2009, lembro de alguns detalhes, não todos. Eu e Eduardo havíamos brigado. Não quero registrar agora os motivos todos. É longo e não vale a pena. Talvez depois. Desestabilizei. Na época, não fazia acompanhamento com a médica que me diagnosticou porque estava sem grana para bancar o tratamento, as consultas eram caras. Estava com um médico do plano que só me medicava, mas não me acompanhava com terapia. Lembro que fui para a internet e fiz uma longa pesquisa sobre suicídio. Encontrei algumas ocorrências com um dos medicamentos que tinha em casa. Tinha três caixas fechadas dele. Juntei com mais montanhas de outros medicamentos cujos nomes não citarei aqui por razões óbvias e tomei tudo com vodka. 

Acordei no hospital sem entender nada. Uma familiar minha recebeu um e-mail meu com senhas de banco, etc. Ela não costumava abrir e-mails aos fins de semana e por essa razão, mandei uma mensagem com meus dados para ela. Mas nesse dia, abriu. Nada é por acaso. Ela, então suspeitou de algo e quando chegou à minha casa, tocou a campainha e eu não abri, pois, segundo ela, já estava totalmente dopada. Ela conta que começou a chamar pelo meu nome até que me dirigi até a porta e girei a chave com dificulade. Não lembro de nada. 

Ao ligar para Eduardo, que estava no supermercado, essa minha familiar recebeu a seguinte resposta: que ele ainda ia passar as compras no caixa e não sabia o que fazer. Era muito amor, falem a verdade? Ela então ligou para os bombeiros que a orientaram a conseguir resgate com alguém mais rápido. Foi o que aconteceu. 
Passei cerca de uma semana no hospital e depois mais quase um mês numa clínica psiquiátrica, onde vivi uma das piores experiências da minha vida. 

O mundo NÃO é bipolar

Criar esse espaço é um desejo antigo, desses que a gente vai adiando, mas hoje, com as férias da minha psiquiatra, senti uma necessidade maior de um ambiente onde pudesse despejar minhas angústias, lamentos, seja o que for (espero que alegrias também) sem o peso da identidade, do julgamento. Não, eu não me chamo Ana Costa. 

Depois de receber o diagnóstico da bipolaridade, no início de 2009, experimentei uma sensação de tristeza e alívio simultâneos. Estava mergulhada numa depressão grave e foi isso que me levou, pela primeira vez, a uma consulta com uma médica psiquiatra, depois de uma maratona que posso relatar noutra ocasião. A tristeza, para quem já estava deprimida, falou até mais baixo que o alívio de saber que o que eu sentia poderia ter tratamento. 

Na ocasião, vivia um relacionamento conturbado, permeado de ciúmes, brigas e sobre o qual, provavelmente, falarei aqui também. Achava, pois, que estava diante da salvação após esse diagnóstico. Mas não estava. Não posso falar por todos os bipolares, mas a minha vida é ainda permeada por uma luta permanente contra essa maldita doença. 

Da primeira delas, eu desisti: convencer as pessoas sobre o meu problema. Antes de ter minha primeira crise depressiva grave, quando mal conseguia reunir forças para me levantar da cama, quase sempre fui uma pessoa marcada pela alegria, bom humor e tive crises eufóricas de longa duração sem que ninguém desconfiasse. Eu era muito "alto astral". 

Assim, essas mesmas pessoas que nunca acharam que eu estava eufórica, incluindo familiares, não aceitam que minhas oscilações sejam motivadas por um transtorno, uma desordem. A maioria delas acredita que, na verdade, não tenho nada. Um de meus melhores amigos, quando toco nesse assunto (tocava, porque não falo mais) me diz que quando eu parar de tomar meus medicamentos, ficarei boa de tudo, porque sou perfeitamente normal. Ele me conheceu eufórica. 

De lá pra cá, iniciei um relacionamento altamente complicado e recaiu sobre meu ex-namorado a responsabilidade por eu ter "pirado", já que meu diagnóstico aconteceu enquanto estávamos juntos. É bem verdade que nossos desentendimentos, minha insegurança em relação a ele, sua falta de respeito comigo, a extrema imaturidade dele, que aos 40 se comportava como um moleque de 15 em muitas e importantes horas, funcionavam como gatilhos para crises. Mas não motivaram minha doença. 

Acredito tê-la herdado de minha mãe, que sofria com o mesmo mal, na ocasião chamado de psicose maníaco-depressiva. Nome que, aliás, considero mais adequado, embora menos "palatável". Me incomoda um pouco quando escuto coisas como "o mundo é bipolar". As pessoas não sabem o que estão dizendo.